terça-feira, 15 de maio de 2018

Falso discurso da Escola Sem Partido avança no Congresso

Para coordenador da Contee, projetos da Escola Sem Partido representam a nova Lei da Mordaça
Na terça-feira 8, o deputado Flavinho (PSC) apresentou o projeto da Escola Sem Partido (PL 7180/14) prevendo que cada sala de aula tenha um cartaz com seis deveres dos professores, entre os quais o primeiro é a proibição de que os docentes “cooptem” os estudantes para correntes políticas, ideológicas ou partidárias.
O projeto propõe, na verdade, a escola de partido único, porque proíbe o debate e a livre circulação de idéias nas salas de aula. Para muitos, trata-se de uma verdadeira “Lei da Mordaça”.
O programa obriga os professores a manter a suposta neutralidade em sala de aula ao lecionar várias disciplinas como, por exemplo,história e geografia. Claro que não se pode ser favorável a nenhuma espécie de doutrinação no ambiente escolar, mas os defensores do Escola sem Partido, como destacou a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee) ao dizerem que “desconhecem solenemente o processo pedagógico, uma vez que educação pressupõe, em seu sentido pleno, o incentivo à capacidade reflexiva, ao diálogo, à construção da cidadania, sendo, portanto, uma atividade política por excelência, no aspecto etimológico da palavra”.
Qualquer proposta fora disso é defender uma escola acéfala, que formaria estudantes completamente alienados. Desnecessário dizer que esse é o mundo ideal para os maus políticos.
Como falar do Golpe Militar de 1964 sem lembrar as perseguições, prisões e assassinatos de civis promovidos pelo Estado brasileiro durante a Ditadura Militar? Como explicar o fim da União Soviética sem uma contextualização política e econômica?
Os apoiadores mais afoitos (e conservadores) dessa proposta já defendem até exclusão de disciplinas como Filosofia e Sociologia da grade curricular das escolas. Um absurdo total; ou seja, seria cômico se não fosse trágico, uma vez que, em caso de descumprimento dessas propostas de lei, professores estariam sujeitos a várias punições, que vão desde uma suspensão, demissão e até, acredite, prisão.
Apesar de não ter qualquer sustentação pedagógica e jurídica, as propostas do tal Escola sem Partido já tramitam em vários Estados brasileiros. Em 2017, o Partido Progressista, o Partido Social Cristão, Partido da Social Democracia Brasileira e MDB (Movimento Democrático do Brasil, ex-PMDB) foram os partidos que mais apresentaram PLs do ‘Escola sem Partido’ e contra ‘ideologia de gênero’ pelo país.
Desde 2014, quando foi apresentado o primeiro projeto de lei, de autoria de Flávio Bolsonaro, na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, a média por ano de projetos idênticos ficava em torno de 20. Em 2017, chegou a 91, de acordo como estudo do grupo Professores Contra o Escola Sem Partido.
Melhor seria se esses políticos substituíssem os professores por robôs que poderiam, assim, transmitir o conteúdo para os alunos ou talvez simplificar tudo com uma simples consulta na internet.
É bom lembrar que o referido programa ainda contraria a Constituição Federal, que prevê a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber. A Contee tem reiteradamente apontado — incluindo na campanha nacional contra a Lei da Mordaça e na vitoriosa Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) impetrada no Supremo Tribunal Federal — que a censura, a perseguição e a criminalização dos professores representam uma afronta à Constituição, à liberdade de aprender e ensinar e à concepção de uma educação crítica, democrática e cidadã.
No ano passado, a educação brasileira foi criticada pela Organização das Nações Unidas (ONU) precisamente pela retirada dos termos “gênero” e “orientação sexual” do texto da Base Nacional Comum Curricular (BNCC).
A Lei da Mordaça afronta os principais tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, entre eles a Declaração Universal dos Direitos Humanos que, no seu artigo 18, destaca:
“Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; este direito implica a liberdade de mudar de religião ou de convicção, assim como a liberdade de manifestar a religião ou convicção, sozinho ou em comum, tanto em público como em privado, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pelos ritos”.
E no artigo 19: “Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de expressão…”.
REDAÇÃO 14 de Maio de 2018

João Batista da Silveira é coordenador da Secretaria de Assuntos Jurídicos da Contee 
http://www.cartaeducacao.com.br/artigo/falso-discurso-da-escola-sem-partido-avanca-no-congresso/

Gramsci, o pequeno diabo da ideologia no Brasil



Coerentemente com o clima de caça às bruxas cada vez mais evidente, no Brasil está em curso uma dura polêmica (com editoriais n’alguns dos principais jornais nacionais) em torno de uma suposta hegemonia gramsciana nos cursos de ciências humanas.
Antonio Gramsci, o escritor italiano mais estudado e traduzido no mundo, juntamente com Dante e Maquiavel, objeto de pesquisas científicas nas mais diversas disciplinas (da teologia à crítica literária, da pedagogia à filosofia política, da linguística à história das relações internacionais), em todos os continentes, inclusive países não classificados como suspeitos de simpatias socialistas, como os EUA, na histeria coletiva que parece ter atingido o Brasil, ele é considerado como o responsável pela ideologização, entendida como uma visão partidista e anticientífica, das principais universidades públicas.
Trata-se, obviamente, de uma mentira, pois, seja como for, essa corrente de pensamento, embora significativa, continua amplamente minoritária nas várias universidades; mas, indo além desse mero dado quantitativo, entremos no mérito da questão. Não compreendemos por qual motivo podemos utilizar livremente referências teóricas como Locke, Constant, Smith e Tocqueville – ou afirmamos o primado absoluto da visão liberal (na economia, nas relações sociais, na história do pensamento político), e não sermos acusados de ideologismo. Por outro lado, se usarmos categorias do materialismo histórico ou da crítica da economia política, automaticamente nos tornamos culpados de manipuladores intelectuais ou ideólogos.
Em linhas gerais, a principal preocupação hoje é evitar a “postura ideológica”; por isso, é preciso ater-se aos fatos e aos documentos, sem que sejam conectados de acordo com um discurso, orgânico e coerente ou contraditório, fruto da própria capacidade de escolha e que seja funcional às próprias finalidades. Certamente, resta compreender por que motivo essa discricionariedade do discurso é um problema quando realizada por intelectuais portadores de determinadas concepções de mundo e não por outros.
Em todo caso, evitar uma postura ideológica, no mais vulgar sentido do termo (o que seria mais correto falar de demagogia), é uma exigência real, sacrossanta, dos intelectuais. O próprio Gramsci assinalou o caráter fetichista e ideológico de certa historiografia do Risorgimento, que  manipulava o passado para legitimar as exigências políticas do presente e “fanatizar a vontade da nação”, sem mobilizar no processo de unificação italiano as grandes massas camponesas.  No entanto, quando essa exigência “empírica” se torna apenas um álibi para tirar o direito de cidadania às leituras críticas da realidade, nos encontramos diante da mais clássica das operações políticas e ideológicas; e a retórica da “objetividade anti-ideológica” é apenas a “folha de parreira” que serve apenas para encobrir uma grande hipocrisia.
Goste ou não, a visão do mundo a qual cada um de nós portamos (mais ou menos conscientemente) não é uma blusa que podemos vestir ou tirar quando nos preparamos para fazer uma pesquisa ou lecionar. Mesmo por detrás da mais rigorosa escolha dos materiais a serem utilizados, ou a seleção das assim chamadas fontes, há inevitavelmente uma avaliação arbitrária (subjetiva), um propósito (ou preconceito) relacionado com a concepção de mundo da qual somos portadores mais ou menos conscientemente. Mais do que aspirar à abstrata objetividade na descrição de uma narrativa inevitavelmente subjetiva, seria necessário nos dedicarmos à honestidade intelectual do bom senso, ou seja, avaliar imparcialmente a contribuição dada à história da humanidade por todas as diferentes visões de mundo, mesmo aquelas mais distantes da nossa. Estabelecer uma hierarquia seletiva – e a partir dela elaborar um novo “rol” das obras destinadas à condenação eterna por heresia, por se oporem a um hit parade dos autores aceitos na corte – seria exatamente o oposto do propósito que (instrumentalmente) se afirma querer perseguir, dando lugar à mais tradicional forma de arbitrariedade e censura conservadora.

GIANNI FRESU
PUBLICADO EM 07.05.2018
http://www.fmauriciograbois.org.br/portal/artigos/154316/2018-05-07/gramsci-o-pequeno-diabo-da-ideologia-no-brasil

sábado, 5 de maio de 2018

10 atitudes simples para conquistar 10 em Política e em outras disciplinas

As atitudes sugeridas abaixo, não apresenta segredos e mágicas, são simples e podem serem utilizadas por qualquer alun@s, até mesmo por aquel@s que, em princípio, não gostam de ler e estudar, mas, por incrível que possa ser, pretendem serem aprovados nas diversas disciplinas se tornarem profissionais: comunicadores e jornalistas. 

Portanto, como não há como “correr ou fugir”, gostando ou não, a alternativa é indolor, não possui contraindicação e aquel@s que optarem por adotar as sugestões apresentadas, devem, simplesmente, adotarem esta “receita” que é única e pode produzir excelentes resultados, somente é necessário: 

1 – Ler atentamente os textos indicados na Bibliografia Básica e se possível, conforme o tempo de cada um@, buscar outras referências, complementares, relacionados a temática. Realizar esta alternativa, não significa ga$tos extras, pois na Internet, há uma imensa diversidade de “ofertas” gratuitas;

2 – Ao ler os textos solicitados, destacar/sublinhar as principais ideias apresentadas, preferencialmente com um marca textos ou lápis, e ao terminar a leitura, releia as ideias destacadas;

3 – Relacionar as ideias do texto lido com outros textos e com o conhecimento que já possui. Para complementa-los não seja acomodado, procure ver bons filmes e documentários – No Youtube há uma grande diversidade e é gratuito. Afinal, é uma excelente forma de aprender, tendo lazer e divertindo-se. Visite com frequência a página no Facebook - Conhecer para Transformar – A política como espaço e instrumento e caso deseje ter acesso a indicações diversificadas e de qualidade, pode ser acessada também América Latina e os paradoxos em seu processo emancipatório;

4 – Procure criar o hábito de anotar as dúvidas, os principais temas a serem apresentados e debatidos em sala de aula;

5 –Não tenha receio de apresentar, em sala de aula ou em outros locais, as dúvidas e os temas a serem debatidos. Afinal, o bulling praticado por colegas e outr@s, não pode ser aceito e internalizado como um “pecado” seu, sob pena de se neutralizar, tornando-se um@ “sombra” em sala de aula e na vida;


6 – Ouse superar “a sombra” e a provável ilusão de conforto que acredita se encontrar e não tenha receio de falar, discordar e debater em sala de aula. Afinal, como pertencemos a espécie Sapiens Sapiens, não é aconselhável a procura de identificação com outras espécie adaptadas e dependentes do que oferece o meio ambiente e não se esqueça de que o mesmo é mutável;

7 – Procurar ao ler e estudar, criar condições para redigir um texto, por mais simples que seja. Redigir exige conteúdo/conhecimento e aprendizado. A técnica simples para aprender a redigir, é redigindo;

8 – Procure ser solidários com @s colegas, compartilhando seus conhecimentos, dúvidas, afetos e em curto espaço de tempo, constatará que el@s retribuirão, tornando a convivência em sala de aula e em outros locais, mais fácil e motivo de alegria e prazer. Assim, constatará que é fácil ler, estudar, debater e acumular conhecimentos. A consolidação da solidariedade e da amizade, contribui para tornar nossa vida mais fácil e agradável;

9 – Não seja acomodado, preguiçoso, praticante do senso comum e adepto da pobreza política;

10 – A prática dessas atitudes, ao serem incorporadas a seu cotidiano, elas se tornam mais simples e mudarão sua vida. Criando assim, condições para conquistar um 10, não só em Política, mas em outras disciplinas e para superar com facilidade os problemas que surgirem, tornando-se apto frente aos diversos “enfrentamentos” que terá pela vida. Mas, lembre-se: há uma decisão simples e anterior – deixar de ser manipulado e “um@ a mais na manada”.
A decisão é sua! 
Vamos em frente?
Prof. Silvio Costa

O mundo é um belo livro, mas pouco útil para quem não sabe ler”.
Carlo Goldoni (dramaturgo italiano, 1707-1793)

"Tudo que o homem não conhece não existe para ele. Por isso o mundo tem, para cada um, o tamanho que abrange o seu conhecimento."
(Carlos Bernardo González Pecotche (1901-1963), também conhecido pelo pseudônimo Raumsol, foi um escritor, educador, pedagogista, conferencista e pensador humanista, conhecido principalmente como o fundador da Logosofia)

"Um povo ignorante é um instrumento cego da sua própria destruição."
(Simón Bolivar- considerado “libertador da América Latina/espanhola”)

“Ver, Ler, Pesquisar, Estudar, Conhecer: são instrumentos necessários para superar a ignorância e o senso comum e para “desvendar o mundo”, não aceitando as barbáries imposta em nosso cotidiano. Conhecer é uma forma de poder, e o poder não está à disposição de tod@s. As pessoas curiosas, inconformadas, que leem, pesquisam e estudam, estão conscientes de que não há limites para o conhecimento, para mudança e para transformação. Afinal, o que é mais subversivo do que “o olhar perspicaz”, a leitura, a pesquisa, o estudo e o conhecimento?”

Silvio Costa
Prof. de Política e Sociologia na PUC Goiás

terça-feira, 1 de maio de 2018

O desmonte do ensino médio



por Ana Júlia Ribeiro* — publicado 14/02/2017 00h14, última modificação 13/02/2017 14h21
Resta agora resistir nas escolas à implantação da reforma aprovada
Ocupação
As ocupações não podem ter sido em vão

O Senado aprovou, na noite da quarta-feira 8, a Medida Provisória 746, conhecida como a (contra)reforma do ensino médio. Será um dia triste para a rede pública de ensino. O governo que chegou ao poder sem voto popular mais uma vez passou por cima da opinião pública e ignorou a luta realizada pelos estudantes secundaristas e universitários. 
Desde 26 de setembro de 2016, quando foi publicada a MP 746, estudantes de todo o Brasil têm se manifestado contra a proposta por meio de ocupações, trancamento de vias e manifestações de rua, por entenderem o quanto ela agride a rede pública e distorce as reais necessidades dos alunos. Recebemos como resposta a perseguição policial e uma forte repressão às nossas manifestações.
Com um discurso fraco e promíscuo, as bases do governo tentaram desmoralizar o movimento dos estudantes com argumentos do tipo “os alunos vão poder escolher o que estudar”. Como se não soubéssemos que, na realidade, será a escola que escolherá qual área curricular será ofertada. Como se não soubéssemos que escolas periféricas terão o ensino ainda mais precarizado.
Os estudantes ouviram e leram discursos a respeito da queda do desempenho do ensino médio nos últimos 20 anos. Esse seria o motivo da (contra)reforma, mas não vimos propostas de se mudarem o método e a didática de ensino, bem como o modelo de avaliação.
Da mesma forma, não foi discutida uma proposta de formação humana cidadã. Ao contrário, houve uma priorização do mercado de trabalho e de um sistema que só enxerga o estudante como futura mão de obra.
O mercado não quer pôr a mão no bolso para promover treinamentos e qualificação profissional para as suas necessidades de força de trabalho, e quer que o Estado faça os investimentos que lhe cabem.
A Medida Provisória objetiva a implantação do ensino integral de sete horas, mas seus formuladores e o ministro da Educação, Mendonça Filho, se esquecem de que as escolas não têm estrutura para os alunos ficarem nem sequer por quatro horas.
A MP também defende o professor com notório saber, mas esquece, propositalmente, de que, hoje, cerca de 50% dos mestres não têm formação específica nas áreas em que atuam e que esse fato prejudica muito a qualidade do ensino.
Em seu texto original, a MP 746 retira a obrigatoriedade de quatro disciplinas – filosofia, sociologia, artes e educação física. Assim, reafirma definitivamente que a reforma do ensino médio atende ao objetivo de sucumbir o aprendizado crítico do estudante de escola pública.
Que reforma é essa que valoriza ações prejudiciais à qualidade do ensino? Almejaria realmente a melhora da educação pública? Como um governo impopular consegue aprovar todas as suas propostas? Como uma Medida Provisória reprovada por mais 94% da população pode ser aprovada? Quem são os representantes do povo e por que não atendem a sua vontade?
Está mais do que claro que a nossa democracia, há algum tempo, tem sido ignorada e descartada com falsas legalidades e desrespeitos à Constituição Federal. Não podemos, porém, desanimar nem desistir. Não podemos ceder aos retrocessos promovidos por quem pretende se apropriar dos direitos do povo.
Mendonça Filho
A MP de Mendonça Filho passou no Senado (Foto: Elza Fiúza/ABr)
Vivemos numa sociedade, todos somos sócios dessa sociedade. Ninguém é dono mais do que ninguém. Por conta disso, nós, estudantes, não podemos deixar de lutar. A luta não acaba com a aprovação da MP. Mesmo aprovada, a luta deve continuar e poderá ser travada no interior das instituições de ensino.
A resistência é não deixar a (contra)reforma do ensino médio ser implementada em nossas escolas. De que maneira? Sugiro a todos os estudantes que se unam com seus colegas e professores progressistas e elaborem uma proposta de uma nova escola. Uma proposta de escola que queremos, que nos represente e que tenha caráter emancipatório.
Encaminhem as propostas às respectivas Secretarias de Educação e de forma alguma recuem. Pressionem os governos estaduais até que eles abram o diálogo e estejam dispostos a conversar e elaborar um projeto de escola em parceria conosco. Agora é a hora de mostrarmos tudo o que vivemos nas ocupações.
Depois de termos passado por noites de tensão, em decorrência da repressão e das ameaças feitas todos os dias, depois de noites sem dormir por estarmos preocupados com a segurança uns dos outros e por planejar a todo instante como a escola poderia se tornar um ambiente de convivência saudável, muitos aprendizados e descobertas ficaram evidenciados. Ficou mais do que comprovado que temos o direito e o dever de participar da elaboração e discussão de um novo sistema de ensino para o País.
Por fim, é hora de colocarmos no papel a experiência de uma gestão democrática nas escolas. Temos a consciência de que o poder é do povo. O poder é nosso e, por princípio, nos pertence. Temporariamente o emprestamos aos nosso governantes. Se eles não nos atenderem, nós o tomaremos de volta.
*Estudante secundarista. Tornou-se um dos símbolos do movimento de ocupação das escolas públicas em 2016
Fonte: https://www.cartacapital.com.br/revista/939/o-desmonte-do-ensino-medio

O Bird, a Kroton e os tentáculos privatistas sobre a educação

Em artigo, coordenadora da Contee reflete sobre os impactos do empréstimo do Brasil com o Bird e a recente compra anunciada pela Kroton Educacional
 
Duas notícias na área educacional despertaram a atenção — e o alerta — nos últimos dias. Em 18 de abril, foi publicada no Diário Oficial da União a Resolução N° 4/2018, do Senado Federal, que autoriza o governo brasileiro a pegar um empréstimo de US$ 250 milhões com o Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (Bird), para o financiamento parcial do “Projeto de Apoio à Implementação do Novo Ensino Médio”.
Poucos dias depois, em 23 de abril, a Kroton Educacional anunciou a compra do controle da Somos Educação, da Tarpon Gestora de Recursos, por R$ 4,6 bilhões (mais R$ 1,7 bilhão para grupos societários minoritários), a maior transação financeira da história da educação básica no país.
As duas informações podem, a olhos leigos, parecer desconectadas, mas fazem parte de uma mesma ameaça: a privatização desse nível de ensino no Brasil. A autorização para a contratação da operação de crédito com o Bird tinha sido dada pelo Ministério do Planejamento ao Ministério da Educação em julho do ano passado. Na ocasião, o MEC alegou que a maior parte do montante emprestado seria destinado ao Programa para Resultados (PforR), que vincula os repasses do empréstimo ao alcance de resultados, a serem medidos por indicadores que serão acordados entre o ministério e o Bird.
As ações previstas incluem a formação de técnicos educacionais para a adaptação dos currículos e elaboração dos itinerários formativos; o repasse de recursos para reprodução de materiais de apoio e para incentivar a implementação dos novos currículos, por meio do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE).
Ainda há suporte às secretarias estaduais para a transferência de recursos às escolas para implementação do ensino em tempo integral. O acordo também preveria recursos para capacitação de gestores e técnicos, mediante consultoria especializada oferecida pelo próprio Banco Mundial.
Resumindo, tem-se que, após congelar por 20 anos os investimentos em educação no País, a opção do governo federal foi buscar empréstimos internacionais para pagar seu projeto de privatização do ensino no Brasil, abrindo as portas para a interferência direta do Banco Mundial. Vale lembrar que se trata da mesma instituição financeira internacional segundo a qual os gastos com educação no país são muito elevados, os resultados ineficientes e as soluções seriam precisamente as “parcerias público-privadas” — ou, sem eufemismos, a venda da educação brasileira.
Está-se falando da privatização da escola pública com a total anuência do Estado, que se coloca inteiro a serviço do capital. Enquanto isso, a educação privada, que deveria ser somente uma opção democrática, sem disputar espaço e recursos públicos com a educação pública e gratuita, segue num processo intenso e perverso de mercantilização, financeirização e oligopolização do qual a compra da Somos pela Kroton é o mais recente e escabroso exemplo.
Com ela, a Kroton, que já era a maior empresa do mundo no segmento do ensino superior, consolida-se como líder de mercado também na educação básica. Mais que dona do Sistema Pitágoras, a companhia passa a ser a detentora dos materiais Anglo, pH, Maxi, Motivo, Ser, Geo e Ético, atingindo mais de 1,2 milhão de estudantes. E é justamente nessa fatia — a dos sistemas de ensino, que envolvem a venda de apostilas e serviços de suporte pedagógico às escolas — que está o maior risco de interferência na educação pública, através das “parcerias” com os governos e as escolas.
Nada é à revelia. O relatório do Banco Mundial, no ano passado, defendendo, em outras palavras, a apropriação da educação pelo mercado, e o empréstimo de US$ 250 milhões que esse mesmo banco parece se dispor a dar ao País, embora tenha dito que o problema do ensino brasileiro não é falta de investimentos, trazem, por trás, um mesmo entendimento: para o setor privado, para o capital financeiro, para os grandes interesses internacionais, a educação brasileira é extremamente lucrativa. O fato de que, juntas, Kroton e Somos formam uma companhia com receita líquida anual de R$ 7,5 bilhões e valor de mercado de cerca R$ 29 bilhões, é prova disso. Lucram os empresários, os rentistas, o capital internacional. Sofre a educação brasileira.
Madalena Guasco Peixoto é coordenadora da Secretaria-Geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee) e diretora da Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
Fonte: http://www.cartaeducacao.com.br/artigo/o-bird-a-kroton-e-os-tentaculos-privatistas-sobre-a-educacao/