Gregório Grisa Publicado* em
30.05.2018
“Quem
questiona essa metáfora pobre da gestão doméstica deve ser taxado como
irresponsável do ponto de vista fiscal? Bobagem. Essa é mais uma dentre tantas
cantilenas liberais que se mostram palatáveis no discurso e pouco se sustentam
em evidências”.
Após o impeachment, a nova equipe
econômica apostou nos cortes de investimento público, aprovou a PEC 95 (que
congela os gastos não financeiros da União por vinte anos) e vem intensificando
concessões e privatizações além de outras medidas de contração fiscal.
A metáfora usada amplamente pelo
presidente e seus ministros era de que administrar o país seria como
administrar um lar. Quanto mais despesas você corta, mais saudável ficariam
suas finanças, menor seria sua dívida. A promessa era de que a dívida passaria
a cair com os ajustes realizados, pois havia um temor (terrorismo) de
insolvência diante de um crescimento “descontrolado” da dívida pública.
Naquela época, muitos alertavam para o
quão rasa e imprópria era a comparação entre gestão pública e gestão doméstica.
Passado um tempo, a equipe econômica de Meirelles notou que errou na mão nos
cortes, previu um déficit exagerado que ajudou a estagnar uma economia já
nocauteada.
Quem questiona essa metáfora pobre da
gestão doméstica deve ser taxado como irresponsável do ponto de vista fiscal?
Bobagem. Essa é mais uma dentre tantas cantilenas liberais que se mostram
palatáveis no discurso e pouco se sustentam em evidências.
Vejamos. Dados do primeiro semestre de
2018:
ü
Desemprego voltou a crescer no último
trimestre e atinge 13,7 milhões de pessoas.
ü Trabalho
sem carteira assinada e “por conta própria” supera pela 1ª vez emprego formal
em 2017.
ü Investimento
público cai para 1,17% do PIB e atinge o menor nível em 50 anos.
ü A
Dívida Líquida do Setor Público saiu de 38,9% em março de 2016 para 52% do PIB
em março de 2018.
A correta redução da taxa básica de
juros (Selic) trouxe o único dado positivo em relação a dívida pública, seu
custo de carregamento caiu timidamente. Porém, há espaço para uma queda ainda
maior da Selic, tendo em vista que os juros para pessoas físicas e jurídicas
cobrados pelos bancos se mantêm muito acima do razoável. Cabe o parêntese de
que a inclinação de crescimento da dívida tem início no fim de 2014 e ganha
força em 2015 no rompante neoliberal do governo Dilma.
Toda argumentação utilizada pelo governo
para aprovar medidas como a reforma trabalhista e propor congelamento do
investimento público vem sendo derrotada pelos fatos.
Os dados mostram que a dívida pública
(bruta e líquida) aumentou, o desemprego permanece alto e a atividade econômica
patina. A contração do investimento público estrangula cadeias produtivas
inteiras, faz o investimento privado se reprimir, insinua um horizonte de
mercado interno com parca capacidade de consumir e, em consequência, enxuga a
arrecadação.
A maioria dos pré-candidatos à
presidência se mostra simpática às medidas do governo Temer. São considerados
candidatos liberais. As quatro últimas eleições presidenciais mostram que essa
perspectiva é “ruim de voto”, um programa como a “Ponte para o futuro” de Temer
não vence eleições.
Os dados mostram que um governo
puramente liberal, com um “homem do mercado” como ministro da Fazenda, não
produz nenhum resultado social positivo, pelo contrário, a regra tem sido a
precarização dos serviços públicos e a desestabilização de direitos que a
frágil democracia brasileira vinha tentando garantir.
A Europa adotou a cartilha
liberal/austera por uma década, pós-crise de 2008, e nenhuma evidência sugere
que tenha dado certo. Portugal e Grécia estão se recuperando por meio de
projetos de centro-esquerda que sabem a relevância de investimentos estatais, o
Brasil e seus eleitores devem mirar esses exemplos.
*Gregório
Grisa é pós-doutor em Sociologia e professor do Instituto Federal do Rio
Grande do Sul (IFRS).
Artigo retirado da página: http://www.grabois.org.br/portal/artigos/154396/2018-05-30/administrar-o-estado-e-o-mesmo-que-administrar-uma-casa, em 01/06/2018 às 12h33m.