sábado, 7 de julho de 2018

Princípios 153 discute a sucessão presidencial: Manuela D´Ávila

“Sou parte de uma corrente que, como diz o nosso hino, tem o Brasil como um sonho intenso”

Cláudio Gonzalez
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Entrevista com Manuela d´Ávila


No último dia 17 de novembro, dois dias após a comemoração dos 128 anos da Proclamação da República, centenas de militantes comunistas celebraram o lançamento da pré-candidatura à Presidência da República de Manuela d’Ávila (PCdoB). O ato ocorreu durante a abertura do 14º Congresso da legenda, realizado em Brasília, e significou uma novidade na estratégia política do partido que, desde a redemocratização do país, nunca havia comparecido às disputas presidenciais com candidatura própria. 
Como ela havia previsto, o Congresso seria o primeiro grande momento de sua pré-candidatura, pois a “militância é o coração do PCdoB”. “Hoje, certamente, vivo o momento mais bonito dessa trajetória, ao ser lançada pré-candidata à Presidência da República por nosso partido. Se o partido comunista é a honra do nosso tempo, como disse o Neruda, que honra enorme para mim ser a candidata dos comunistas à presidência do Brasil”, declarou a pré-candidata na ocasião.
Em entrevista exclusiva para Princípios, Manuela voltou a falar da emoção de encarar o desafio da disputa presidencial. “Eu me sinto parte de uma velha corrente que, como diz o nosso hino, tem o Brasil como um sonho intenso, um sonho de país desenvolvido, que cumpra o seu destino de grande nação dando assim condições de vida dignas para os seus filhos”, afirmou.
Apesar de ser a mais jovem candidata mulher a disputar a presidência, Manuela não embarca na apologia do “novo” na política. “Eu não me considero o novo e acho que quem se vende dessa maneira está fazendo uma marquetagem um pouco vazia. Tenho orgulho de fazer parte de uma velha corrente de luta, nacional e internacional, que aos 96 anos de idade oferece ao povo uma bandeira sem nenhuma mancha. Isso vale mais do que qualquer suposta novidade dessas que são, muitas vezes, como dizia o Cazuza, um museu de grandes novidades.”
No último dia 16 de abril, a pré-candidata lançou, em Sã Paulo, uma carta-compromisso que já traz as ideias iniciais do que será seu programa de governo (veja nas páginas 18 a 30). Nesta entrevista à Princípios, questionada sobre quais seriam as prioridades de sua plataforma de ação, Manuela destacou temas como a necessidade de construir um projeto nacional de desenvolvimento baseado na busca pelo crescimento econômico, na reindustrialização e na valorização do trabalho. Destacou também a necessidade de valorizar e resgatar “a democracia e as garantias constitucionais inscritas no texto de 1988”. “Para além disso, é preciso enfrentar, nesse marco, o conjunto das opressões que só crescem neste ambiente deletério que estamos vivendo, o machismo, o racismo, a homofobia”, afirmou.
Neste sentido, a pré-candidata comunista concordou que este é um diferencial importante de sua plataforma: as bandeiras identitárias e a causa feminista: “Este é um grande diferencial da nossa campanha, tocar em uma ferida aberta na sociedade brasileira, a da exclusão da mulher da vida política”, afirma. Para Manuela, a esquerda não é só eleição, é programa e “as causas identitárias são parte do nosso programa justamente porque pensamos um Brasil para todos”.
Segundo ela, considerar o enfrentamento à essas opressões como algo contraditório ao Projeto Nacional é um erro. “Ela é parte fundamental desse todo maior que é a luta pela realização do Brasil como nação independente”.

PERFIL
Manuela d’Ávila é jornalista, tem 36 anos e é deputada estadual desde 2014, a mais votada naquele pleito. Em 1999, filiou-se à União da Juventude Socialista (UJS). Também foi vice-presidenta da União Nacional dos Estudantes (UNE). No PCdoB, ingressou em 2001 e, em 2013, foi eleita presidenta estadual do partido. 
Em 2004, com 23 anos, foi eleita a mais jovem vereadora de Porto Alegre. 
Disputou duas vezes a prefeitura de Porto Alegre e cumpriu dois mandatos como deputada federal, tendo sido a mais votada do Rio do Grande do Sul. Em 2010, teve mais de 400 mil votos, o que representou 8,06% dos sufrágios. Foi líder do PCdoB na Câmara dos Deputados, indicada três vezes pelo DIAP como uma das 100 “Cabeças” do Congresso e cinco vezes ao Prêmio Congresso em Foco, que premia os melhores parlamentares do Brasil. Na Câmara Federal, Manuela foi autora da Lei do Estágio e relatora do Vale-Cultura e do Estatuto da Juventude, presidiu a Comissão de Direitos Humanos e foi coordenadora da bancada gaúcha. 
Manuela d’Ávila é casada com o músico Duca Leindecker. O casal tem uma filha de dois anos, Laura. Também mora com eles, em Porto Alegre, o filho de Duca, Guilherme, de 13 anos.

Confira, a seguir, a íntegra da entrevista:

Princípios: Quando te procuraram pela primeira vez para falar na possibilidade de uma candidatura presidencial você aceitou o desafio na hora ou pediu pra pensar no assunto? Sua primeira reação foi mais de entusiasmo ou de preocupação?
Manuela d´Ávila: Participei desde o início dos debates sobre a candidatura e o meu nome surgiu entre os possíveis aí, no começo, de modo que não posso falar exatamente em surpresa. Fui pensando no correr do tempo e aceitei pela honra de representar o meu partido e pelo desafio que o Brasil nos coloca, especialmente nesses tempos difíceis. 
Princípios: Agora que você já está na estrada, realizando sua pré-campanha, qual a sensação de encarar este desafio?
Manuela d´Ávila:
 Estou muito animada e feliz, apesar de todo o esforço que uma candidatura implica. É muito bom viajar o país apresentando as nossas ideias, colhendo opiniões e apoios. Temos tido uma receptividade maravilhosa, nossa mensagem - a de que é preciso lutar para que o Brasil se realize plenamente como nação independente -  tem sido recebida com entusiasmo e isso é um grande estímulo. 
Princípios: Como sua família está reagindo a essa novidade?
Manuela d´Ávila: Tenho o apoio de todos lá de casa, da Laura, do Guilherme meu enteado e de meu marido, o Duca. Nisso sou quase uma exceção, tenho um marido que me apoia em minha vida pública. Minha mãe, meu pai, minhas irmãs e irmão também são um esteio importante que tenho nesta jornada.
Princípios: Seus discursos e suas postagens nas redes sociais mostram que a maternidade foi um ponto de virada muito importante na sua trajetória. Sua filha Laura, 2 anos, está junto contigo em muitos eventos. Como você tem conciliado esta questão de ser mãe com a atividade política, que costuma ser, em geral, um ambiente predominantemente masculino e árido?
Manuela d´Ávila: A Laura é minha grande companheira. A campanha tem sido uma oportunidade de estarmos juntas em momentos muito bonitos, marcantes. Fico pensando que poucas crianças tiveram a oportunidade que ela está tendo de ver gente diferente, brincar com crianças de vários Estados, ouvir tantos sotaques, sentir tantos sabores... É claro que há momentos também em que ela está cansada ou preferia estar comigo exclusivamente para ela, mas é algo que estamos aprendendo a vivenciar juntas na estrada. Há um estranhamento de algumas pessoas com a presença dela. Isso se dá em função do machismo que impera na política. Os homens só estão por aí brilhando porque há um aparato, formado por mulheres, que cuida das crianças que eles também colocaram no mundo. De modo que a presença de crianças parece, aos olhos de quase todos, como uma coisa um pouco exótica. Mas ela tem que ser naturalizada, porque as mulheres estão aí pra ficar e muitas mais de nós estão chegando, de modo que este é o novo normal. 
Princípios: Você convive na Assembleia com alguns deputados provocadores de extrema-direita e o atual prefeito de Porto Alegre, ligado a grupos conservadores, também vive atacando a esquerda e os comunistas. Você tem sido alvo destes ataques? Como lida com estes posicionamentos?
Manuela d´Ávila: Eles já sabem que nada vai me acovardar. É claro que este ambiente é péssimo, desgasta profundamente quem atua no dia a dia. Pior do que isso, este clima de ódio cria um debate no qual ninguém ouve ninguém, no qual é muito difícil encontrar caminhos, consensos ainda que parciais. Quem perde com isso é o povo. 
Princípios: O Rio Grande do Sul de Vargas, Jango e Brizola já elegeu governador petista, te elegeu a deputada mais votada e há uma série de momentos políticos importantes em que o povo gaúcho prestigiou a esquerda. Mas nos últimos anos a direita tem ocupado quase todos os espaços de poder no estado. Como você avalia esta mudança? E, mais especificamente, qual sua avaliação do governo Sartori?
Manuela d´Ávila
: O governo Sartori é uma tragédia para o Rio Grande do Sul, dentre outros motivos porque resolveu enfrentar a crise do Rio Grande com uma política de destruição completa do aparelho de Estado. E o Estado é um elemento determinante para que saiamos da crise, porque é ele quem pode permitir, através de uma ação eficiente, retomar o crescimento e o desenvolvimento econômico. O Rio Grande do Sul pode voltar a crescer, a ter uma arrecadação que o sustente, mas isso não vai acontecer se todos os instrumentos importantes para isso forem liquidados pelo Governo do Estado. 
Princípios: A outra provável candidata mulher à Presidência em 2018, Marina Silva, nunca abraçou a causa feminista nas campanhas que disputou, mas você, ao contrário, tem demonstrado que esta será uma bandeira muito importante da sua candidatura. Até que ponto isso será um diferencial na sua campanha?
Manuela d´Ávila
: Este é um grande diferencial da nossa campanha, tocar em uma ferida aberta na sociedade brasileira, a da exclusão da mulher da vida política. Veja bem, em um ranking de 190 países, estamos na 152ª posição quanto a participação de mulheres no parlamento. Temos apenas 10% de mulheres na Câmara e 16% no Senado. Entre os sul-americanos, por exemplo, estamos na última posição! Bolívia e Cuba tem agora mais da metade de seus parlamentos compostos por mulheres. Quanto ao poder executivo, estamos na 161ª. posição entre 186 países. Se você olhar para a atual equipe que governa o país, após dar um golpe na Presidenta Dilma, há somente uma mulher, que é a Grace Mendonça da AGU. Enquanto a média mundial de mulheres no primeiro escalão é de 18%. Em Governos de Estados há 24 anos temos apenas uma mulher como governadora. Em 2015, por 15 votos na Câmara dos Deputados, perdemos a chance de ter cotas para mulheres nos nossos parlamentos, do federal ao municipal. Bolívia, Argentina e México, por exemplo, adotaram mecanismos formais e legislação própria para garantir a participação e a representatividade das mulheres na política. A minha candidatura vem também para expor esta situação dramática. As mulheres não participam da política porque são literalmente barradas, por um patriarcado que está entranhado nas relações familiares, de trabalho e de convívio social. Tente convencer uma mulher a ser candidata a qualquer cargo. Veja como é difícil para ela vislumbrar a superação de todos os obstáculos que se impõem a ela. Comecemos refletindo pelas questões mais básicas: quem fica com as crianças para que as mulheres participem?  Quem vai fazer as tarefas domésticas? Como ela vai pra casa depois de intermináveis reuniões noturnas? E depois avancemos para as mais complexas: como lidar com o assédio, sexual e moral? Com a diferença salarial? Com a invisibilidade de nossas propostas? Com o calar da nossa voz quando tentamos falar? Uma campanha como a nossa cumpre também este papel de conscientizar sobre a dura realidade da exclusão das mulheres da política.
Princípios: Recente artigo de um líder do Partido Democrata dos Estados Unidos aponta que o discurso identitário tem tirado votos da esquerda naquele país. Este debate também comparece no âmbito da esquerda brasileira. Quais suas reflexões sobre este tema? Como as causas ditas identitárias se relacionam com o Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento que é uma questão nuclear do Programa Socialista do PCdoB? 
Manuela d´Ávila
: Você deve estar se referindo à entrevista do Mark Lilla que saiu em março na imprensa. A entrevista chamou atenção porque ele disse que a esquerda deve tirar o foco da pauta identitária para conseguir ser eleita. Ele diz que os democratas perderam a capacidade de conceber e comunicar uma visão de país na qual pessoas de vários grupos diferentes se reconheçam e sintam que o programa político é para elas também. Mas aí é que está a questão, a esquerda não é só eleição, é programa. As causas identitárias são parte do nosso programa justamente porque pensamos um Brasil para todos, em que todos se reconheçam. Nos inspiramos no sonho de nação embalado por Vargas, Jango, Juscelino e que esteve presente nos treze anos de governos populares Lula e Dilma. Este é o nosso norte, a razão de ser da nossa candidatura, inclusive porque só ele é capaz de abrir caminho para transformações maiores. No entanto, existe o que a literatura marxista nominava de contradições no seio do povo. Não há formação econômico-social que não as tenha. A mais importante delas, no capitalismo, é a de classes, que opõe burguesia e proletariado. Mas há outras, como o machismo e o racismo, este especialmente importante em um país com um passado escravista como o brasileiro. A questão central é a questão nacional, a realização do Brasil como nação, mas ela só vai acontecer se os trabalhadores se transformarem, como pensava Gramsci, em “classe nacional”. Isso quer dizer que esta classe nacional precisa se demonstrar capaz de liderar os outros setores, hegemoniza-los, no sentido positivo do termo. Esta liderança só se dará com a classe demonstrando ser portadora de um programa que seja capaz de superar essas contradições.
Considerar o enfrentamento à essas opressões como algo contraditório ao Projeto Nacional é um erro. Ela é parte fundamental desse todo maior que é a luta pela realização do Brasil como nação independente. 
Princípios: O PCdoB é talvez o partido que mais se posicionou a favor de uma ampla unidade da esquerda para enfrentar os retrocessos impostos pelo golpe e retomar o governo para o campo progressista em 2018. No entanto, cada partido de esquerda resolveu lançar candidatura própria. Como obter unidade com esta fragmentação de candidaturas?
Manuela d´Ávila: Nós estamos fazendo tudo para a construção da unidade. A Fundação Maurício Grabois esteve à frente, junto com a suas congêneres dos partidos do campo popular, na organização de um manifesto programático. Temos tido conversações entre os candidatos. Quero crer que as conversas irão se aprofundar nos próximos meses. Disposição de nossa parte não tem faltado e não faltará.

Princípios: Tudo indica que teremos um grande número de candidatos nesta eleição presidencial. Por enquanto, 18 nomes já se apresentaram para a disputa. Qual será a sua marca, o seu diferencial em relação aos demais? 
Manuela d´Ávila
: Defendemos um Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento como caminho para a superação da crise e como vereda para a realização plena do Brasil como nação. Temos falado que é preciso defender a liberdade do Brasil, como país independente, e dos Brasileiros, como cidadãos.
A liberdade do país está em risco, porque estamos vivendo uma enorme ofensiva neocolonial. As grandes potencias e as grandes corporações, como modo de minorar a crise do capitalismo, querem se apossar diretamente dos recursos, especialmente dos países de desenvolvimento médio e de grande riqueza natural, como o Brasil. A defesa absoluta da repactuação da democracia nos país, do respeito à constituição federal de 1988 e a da participação das mulheres na política também serão grandes marcas da nossa campanha.
Defendemos uma nova política econômica que permita abrir um novo ciclo de desenvolvimento com distribuição de renda. Para tanto, é necessário um pacto que privilegie a produção, a atividade dos trabalhadores e empresários produtivos e que subordine a esse projeto o setor financeiro. Uma nova política de juros, de câmbio e de investimento público, mecanismos que mobilizem o investimento privado de forma consistente, uma reforma tributária que faça os ricos pagarem imposto e que deixe de tributar o consumo penalizando os mais pobres são questões nodais desse projeto. Tudo isso só se efetivará com o fortalecimento do Estado, que deverá ser o elemento condutor desse Projeto Nacional de Desenvolvimento.
Temos usado os vídeos como instrumento para apresentar pontos de nosso programa, propostas concretas, recomendo a todos que os assistam e, se possível, contribuam em sua divulgação.
Princípios: Outros pré-candidatos do campo progressista têm dito que será preciso anular atos lesivos do governo Temer, como a PEC que congelou gastos públicos por 20 anos. Quais medidas tomadas pelo governo Temer nestes dois anos pós-golpe você julga mais nocivas? 
Manuela d´Ávila
: Nossa, são tantas medidas nocivas que é até difícil listar, algumas se destacam pelo grau de prejuízo total ao desenvolvimento do Brasil, como a PEC do teto (PEC 55), a Reforma Trabalhista, as medidas permissivas ao Trabalho Escravo, a retirada de famílias do Bolsa Família, a não implementação do PNE (plano nacional da educação), a abertura do pré-sal aos estrangeiros, a Reforma do Ensino Médio, a suspensão da participação na UNASUL, a destruição da FUNAI, as ameaças à Eletrobras, as ameaças ao sistema de Previdência, as ameaças à Petrobrás. Estas últimas esperamos que fiquem como ameaças que conseguiremos reverter após as eleições de 2018.
Princípios: Você é uma profissional da comunicação e tem boa parte de sua trajetória política ligada aos movimentos de juventude. Isso se reflete na sua atuação nas redes sociais, que tem sido muito elogiada. A internet será instrumento prioritário na estratégia de comunicação da sua campanha? Como tem lidado com ondas de fake News direcionadas contra sua pré-campanha?
Manuela d´Ávila
: Já tem sido. Todas as medições de influência nas redes sociais têm demonstrado que estamos nas primeiras posições em todas as ferramentas. As redes, apesar das limitações, são um instrumento importante para quem tem ideias e não tem meios financeiros, nosso caso. Mesmo para quem tem recursos elas têm se tornado a principal arena de disputa de ideias. Veja os últimos escândalos que envolvem o facebook e o roubo de dados para campanhas. Imagine que o Brexit e a eleição de Trump foram contaminadas pelo uso inescrupoloso das redes para campanhas. Não fariam isso se as redes não influenciassem. As fake news são um fenômeno deletério e eu sou uma das vítimas preferenciais desse tipo de ataque. Penso que isso é uma consequência de nossa força nas redes, uma espécie de reação. A questão principal para mim é quem paga a produção e veiculação dessas peças, porque isso custa dinheiro. Penso que os órgãos que estão preocupados com a questão deveriam empreender uma investigação séria para descobrir de onde vem a grana que financia a mentira nas redes. Grande parte da nossa energia de campanha é desperdiçada ao termos que nos dedicar a denunciar e barrar a profusão das fakenews.
Princípios: Nas campanhas que disputou, seus adversários tentaram te atingir com discursos anticomunistas? Se sim, como lidou com isso? Com o crescimento do protagonismo de grupos de direita no país, teme ser alvo deste tipo de preconceito ideológico durante a campanha?
Manuela d´Ávila:
 Sou alvo desse tipo de ataque diuturnamente. É bom lembrar que já disputei, de forma muito competitiva, duas eleições majoritárias. Agora isso se repete e de maneira ampliada. Isso é preocupante porque estamos vivendo episódios de violência política aberta, com uma série de assassinatos de lideranças do movimento popular, da vereadora Marielle, os ataques contra a caravana do Presidente Lula. Mais recentemente contra o Acampamento Marisa Letícia em Curitiba.  Mas o ódio e o anticomunismo não nos intimidarão, manteremos alta a nossa bandeira vermelha e levaremos as nossas propostas a todos os cantos. 
Princípios: Na sua opinião, a campanha de 2018 será polarizada numa disputa entre esquerda e direita ou a tendência, como apontam alguns analistas, é o eleitorado fugir desta polarização?
Manuela d´Ávila
: Penso que no campo conservador há um programa definido, que engloba de Bolsonaro a Marina e que é o da entrega do patrimônio público, da destruição do Estado Nacional, do atendimento dos interesses dos banqueiros e do capital financeiro. É o programa que tem como objetivo mais importante aplainar o caminho para o neocolonialismo.
Contra esse programa estão os candidatos do campo progressista, que tem defendido, cada qual ao seu modo e com suas ênfases, um programa de desenvolvimento para o país. Acho que esta é a polarização real. Torço para que ela fique clara para o povo e que conversas furadas como esta de “centro político”, um engodo completo, não prosperem. Se a polarização existente ficar clara o campo progressista vencerá as eleições. 
Princípios: Na última eleição presidencial no Chile, ocorrida em novembro do ano passado, apesar da vitória do candidato da direita, a grande surpresa da eleição foi a expressiva votação da candidata de esquerda Beatriz Sánchez que, por pouco, não foi para o segundo turno. Você acredita que isto pode ocorrer no Brasil também?
Manuela d´Ávila:
 Acho que em situações limite como a que o país vive coisas extraordinárias acontecem. As pessoas estão cansadas, querem caminhos que não sejam os tradicionais. Eu não me considero o novo e acho que quem se vende dessa maneira está fazendo uma marquetagem um pouco vazia. Tenho orgulho de fazer parte de uma velha corrente de luta, nacional e internacional, que aos 96 anos de idade oferece ao povo uma bandeira sem nenhuma mancha. Isso vale mais do que qualquer suposta novidade dessas que são, muitas vezes, como dizia o Cazuza, um museu de grandes novidades. Agora, apesar de nós virmos de longe, nossas ideias são novas porque derivam de uma leitura da realidade atual, do mundo tal qual se apresenta em nossos dias. Isso pode, de fato, catalisar um movimento mais amplo.
Princípios: A revista Princípios publica, nesta edição, a íntegra do manifesto de sua pré-campanha que foi lançado em 16 de abril no Teatro Oficina, na cidade de São Paulo. Quais propostas e mensagens ali contidas você destacaria?
Manuela d´Ávila:
 Nosso manifesto fala de duas liberdades. A liberdade do Brasil se desenvolver como nação independente, ameaçada pela ofensiva neocolonial e a liberdade de nosso povo, em risco diante dos ataques à democracia, aos direitos individuais, aos direitos civis, à liberdade de expressão, de livre organização, etc.
A liberdade do país contra os novos colonizadores vamos conquistar com um projeto nacional de desenvolvimento, baseado na busca pelo crescimento econômico, na reindustrialização, na valorização do trabalho. Como eu já disse, o caminho para a libertação plena de nosso povo é a realização de todas as potencialidades do nosso país, processo impedido pelo domínio que as grandes potencias estrangeiras e seus aliados exercem por aqui.
Eu me sinto parte de uma velha corrente que, como diz o nosso hino, tem o Brasil como um sonho intenso, um sonho de país desenvolvido, que cumpra o seu destino de grande nação dando assim condições de vida dignas para os seus filhos.
A outra liberdade vamos conquistar reestabelecendo a democracia e as garantias constitucionais inscritas no texto de 1988. Para além disso, é preciso enfrentar, nesse marco, o conjunto das opressões que só crescem neste ambiente deletério que estamos vivendo, o machismo, o racismo, a homofobia. 
Princípios: Qual será, na sua opinião, o grande tema desta disputa presidencial de 2018?
Manuela d´Ávila:
 Lutaremos para que o debate eleitoral se dê no tema real que ele enfeixa: queremos ser um país independente, com um caminho próprio, capaz de realizar todas as suas potencialidades, ou nos contentaremos com a condição de nova colônia das grandes potências? Esse é o grande dilema e o que divide, de fato, os campos no Brasil. Se conseguirmos fazer com que o povo distinga de forma clara essa disjuntiva, penso que a esquerda tem todas as condições de vencer o pleito. 
Princípios: Você tem se engajado com vigor na campanha “Lula Livre”. Há o risco concreto de que esta jornada democrática não consiga libertar o ex-presidente e assegurar seu direito de ser candidato. Isso traz dilemas para o conjunto das forças políticas do país e não só para o PT. Como analisa a prisão de Lula e as consequências desta prisão para a democracia brasileira?
Manuela d´Ávila:
 O presidente Lula está preso sem provas em um processo criticado por nove em cada dez juristas brasileiros e do resto do mundo. O cárcere de Lula está relacionado diretamente com o governo realizado por ele e com a sua posição nas atuais pesquisas de intenção de voto para a presidência. Lula é hoje o preso político mais importante do mundo e a sua situação transforma o Brasil em um país menor no concerto das nações. Não há como explicar uma coisa como essa. É preciso unir todos os democratas, todas as pessoas comprometidas com o Estado democrático de direito para lutar pela soltura do ex-presidente.
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Entrevista respondida por e-mail. 
Edição: Cláudio Gonzalez

07/06/2018

http://www.revistaprincipios.com.br/artigos/153/capa/3262/-sou-parte-de-uma-corrente-que-como-diz-o-nosso-hino-tem-o-brasil-como-um-sonho-intenso.html

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