Em entrevista, a ex-ministra fala sobre o tempo da ditadura e
do avanço nas políticas públicas durante a gestão do PT
Por Lilian
Primi, Lu Sudré e Nina Fideles
Uma mulher de convicções. Assim se define
Eleonora Menecucci, e assim é. Sem meias palavras para definir o que é o
feminismo e também o processo, e os autores, do golpe sofrido pela presidente
impedida Dilma Rousseff, com quem dividiu a cela na época da ditadura. Após
sair da prisão, Eleonora dedicou sua vida às pautas relacionadas a gênero na
academia e na sociedade civil, até receber o irrecusável convite de Dilma para
compor o governo como ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres. São
inúmeros os avanços que ela cita ao longo da entrevista, conquistados no tempo
em que ela participou da gestão do governo. Avanços estes que ela teme que
sejam totalmente interrompidos. O sinal de que isso vá acontecer já foi dado,
quando houve a decisão de extinguir o Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial
e dos Direitos Humanos e atribuir suas funções ao recém intitulado Ministério
da Justiça e Cidadania, sob a batuta de Alexandre de Moraes, ex-secretário de
Segurança Pública de São Paulo.
Nina Fideles – A senhora tem muitos anos de luta frente à
questão de gênero, não é? Como você encontrou o feminismo?
Veja bem, desde que saí da cadeia em 1974, eu priorizei a minha
militância no feminismo – embora nos anos 1980, eu sou fundadora do PT, eu
morasse em João Pessoa. Eu priorizei a minha atuação na sociedade civil com o
feminismo. Por quê? Essa questão é muito importante. Primeiro, porque eu vivi a
tortura na cadeia. Torturas muito misóginas contra nós mulheres. Isso não quer
dizer que eram piores ou menores em intensidade com relação aos nossos
companheiros que estavam presos, certo? Mas violência, estupro, e no caso das
que eram mães, como eu, ou tiveram os filhos torturados na frente, ou foram
torturadas na frente deles ou foram ameaçadas que os filhos seriam torturados.
É aquela compreensão do patriarcado, e eu tive isso na cadeia. O patriarcado
está em todas as frentes da sociedade.
Nós, na situação de cadeia, ficamos muito humilhadas, com a
identidade no chão, e é inominável a dor da tortura. Você pega essa dor da
tortura e articula com a questão do patriarcado lá dentro, quer dizer, as
frases “mulher é mais fácil pra falar”, “mulher é mais frágil”, “vamos ameaçar
a maternidade”. Quando eu saio da cadeia, em final de 1973, início de 1974, eu
priorizo na minha vida a militância feminista, articulada com a militância pela
justiça social – porque eu acho que o feminismo no Brasil nasce pela luta a
favor do voto feminino em 1932, com a Bertha Lutz. Tem uma história anterior,
que é na parte da educação – porque as mulheres não ocupavam lugares na
educação –, mas no voto, as primeiras mulheres que puderam votar precisavam ser
casadas e ter autorização do marido, então isso é impressionante.
Eu saio da cadeia com essa convicção, porque
eu sou uma mulher de convicções, que o feminismo no Brasil nasce grudado na
luta contra a desigualdade social. É um feminismo de classe. Por que ele é de
classe? Porque ele não é só o laissez-faire (expressão que significa total
liberdade ao mercado) da classe média, as mulheres anônimas no Brasil são
absolutamente descriminalizadas e oprimidas por toda essa estrutura patriarcal.
Então, saí da cadeia e fui para Belo Horizonte, eu sou de lá, militei no
feminismo lá, e depois para João Pessoa. E lá em João Pessoa fiz parte de um
grupo coletivo de mulheres que criou o primeiro grupo feminista lá, o “Maria
Mulher”, e eu trabalhei muito com as mulheres. Foi aí a minha opção de
trabalhar junto com as mulheres rurais, em Alagamar, no interior da Paraíba. Eu
trabalhava no Centro de Defesa dos Direitos Humanos da Arquidiocese de lá com
Dom José Maria Pires, e na universidade. Nina Fideles – Em algum momento cruzou
com a Elizabeth Teixeira? Sim, eu sou muito amiga dela. Fomos discutir com a
Elizabeth e mostrar para ela que a luta toda do Julião, do João Pedro Teixeira,
estava grudada na luta dela. Quem era Elizabeth Teixeira nessa história toda?
Foi a grande protagonista, sem dúvida nenhuma. E nesses doze anos que eu vivi em
João Pessoa o latifúndio deu sinais de violência muito grande também contra a
minha pessoa, incendiou minha casa. Mas isso por quê? Eu agregava as duas
coisas da emancipação das mulheres, da luta pelas mulheres pelo “Meu Corpo me
Pertence”, no “Quem Ama Não Mata”, “O Silêncio é Cúmplice da Violência”. Então,
um grande, entre aspas, latifundiário de lá matou uma poetisa, a Violeta
Formiga, ao som de Beethoven que era a música preferida dele e ela era
ex-mulher dele e não queria voltar.
Nós fizemos um movimento enorme lá, isso nos anos 1980,
articulando nacionalmente. Daí se criou o coletivo feminista “SOS Violência
Contra a Mulher – O Silêncio é Cúmplice da Violência”. E aí foi se espalhando.
Então, na sociedade civil eu considero que nós, feministas, colocamos na agenda
política questões muito fortes de gênero. A divisão sexual no trabalho, os
direitos sexuais e reprodutivos, a partir da questão “Meu Corpo me Pertence”,
que é o direito de ter ou não ter um filho, de ter quantos quiser, como quiser
e ter acesso ao serviço de saúde com atendimento de qualidade; a questão da
autonomia econômica, salário igual trabalho igual; e a questão do
enfrentamento à violência. E quando eu vim transferida para São Paulo, para a
Unifesp, nos anos 1990, eu priorizei toda a minha titulação desde o mestrado
que eu fiz em João Pessoa, o doutorado na USP, tudo voltado à questão dos
direitos das mulheres.
Lilian Primi – A senhora trata também das garantias trabalhistas
na questão da maternidade, por exemplo...
Isso estava na pauta. Quem conseguiu a licença-maternidade e a
licença-paternidade foi o movimento de mulheres, foi o movimento feminista. O
sujeito feminista são as mulheres que pautaram esses itens que eu disse. E
evidentemente que eles foram se alargando, a agenda vai se ampliando. E a
questão da maternidade é uma questão que nós pautamos e que diz respeito não só
às mulheres, mas ao casal, seja ele hétero, ou homo, e diz respeito à sociedade
e ao Estado, que tem que dar garantias e condições. Por exemplo, a creche não é
uma questão só para o bem-estar da criança, também é para a mulher, para que
ela possa trabalhar ou fazer o que ela quiser. E toda a minha linha de pesquisa
na Unifesp foi em cima desses itens. Eu formei muitos alunos, estudantes,
homens e mulheres, eu criei no quarto ano médico, que eu coordenava, uma
disciplina que se chama Saúde Integral da Mulher, então nós falávamos de tudo e
levávamos os alunos n0 Centro de Referência à Mulher Casa Eliane de Grammont,
onde eles viam a realidade. E vários deles depois choravam. Por quê? Porque
eles conviviam com a violência doméstica dentro de casa, só não tinham com quem
falar. Eu dei aula muito tempo na enfermagem também, e quando eu era
pró-reitora de extensão, na gestão do Walter Albertoni, durante os quatro anos,
no final do nosso mandato, nós criamos o projeto da zona leste. Foi então que
fui chamada pela Dilma para ocupar o cargo de ministra. Na eleição dela de 2010
eu apareci no primeiro programa de televisão dela, no dia em que o Brasil
perdeu a Copa, foi desclassificado (risos), e eu já tinha negado muito no
governo Lula de ir para lá.
Mas a Dilma tem uma relação comigo que é de irmã, de sororidade
muito grande, de solidariedade enorme. Ficamos presas juntas, ficamos na mesma
cela... Ela olhou nos meus olhos e disse: “Preciso de você”, eu respondi: “Tudo
bem, te ajudo”, mas ela falou: “Não, não, não, lá pra Brasília”, e eu contei
que gostaria de ser candidata à reitora. Daí ela disse: “Não, eu sou sua chefe,
você é funcionária pública, eu estou te requisitando”, então eu não negaria
jamais. Aí fui e nunca mais saí. Então, por que eu contextualizei? Como titular
maior no âmbito das políticas públicas nacionais das mulheres, não era eu
apenas, era o movimento de mulheres e o movimento feminista que foi também
comigo. Eu tenho o maior orgulho de ter feito na minha gestão a gestão mais
participativa com as mulheres, mais de diálogo. Em todos os momentos críticos,
eu chamava não só o Conselho Nacional dos Direitos das Mulheres, mas eu chamava
o movimento de mulheres, o movimento feminista que não estava no conselho, para
decidir comigo, para me ajudar. É claro que às vezes você é convencida, outras
vezes não, mas havia esse protagonismo total ao movimento de mulheres e ao
movimento feminista. O que eu consegui fazer? Dia 6 de agosto agora a Lei Maria
da Penha fez dez anos. Eu aponto que foi onde nós avançamos com maior
determinação, por quê? Começa no governo Lula, consolida no governo Dilma, a
diretriz da Lei Maria da Penha prevista no seu artigo oitavo “implementar no
mesmo espaço físico todos os serviços necessários para o enfrentamento da
violência contra as mulheres”. Fizemos isso com o Programa Mulher Viver sem
Violência, levamos com ônibus para as trabalhadoras rurais essa política,
levamos com parceria da Caixa para as mulheres ribeirinhas. Ampliamos o Ligue
180 para atendimento de mulheres brasileiras que estão fora do País e aqui
dentro, para dezesseis países. Criamos o pacto, a Rede de Pacto de Prevenção à
Violência, uma rede articulada nos municípios pólos, pois nas capitais tem a
Casa da Mulher Brasileira. Sancionamos a Lei do Feminicídio, que torna crime
hediondo o estupro, aumentando a pena de doze a trinta anos para o estuprador –
e se a mulher estiver grávida ou tiver mais do que 60 anos, ou for portadora de
alguma deficiência, ou se o assassinato acontecer na frente das crianças, a
pena aumenta de um terço. Isso modificou radicalmente a punição e a agressão.
Quando me perguntam: “Você acha que aumentou o número de assassinatos?” Não, eu
faço muito bem essa curva histórica, não aumentou. O que aumentou? A coragem
das mulheres em denunciar, perda do medo, a identificação e a prisão e a
punição dos agressores, e a qualidade do atendimento, porque quando era Ligue
180, até março deste ano, as mulheres ligavam e as atendentes indicavam aonde
ela procurar ajuda.
Lilian Primi – Elas faziam dois passos...
Três, quatro, cinco, seis, porque era a via crucis. Com o
Disque, a denúncia delas já se transformava em BO – boletim de ocorrência. A
telefonista tinha um link direto com as cidades em que ela estava com o órgão
mais especializado daquela região. Então a mulher sai com uma resolutividade. E
a sociedade incorporou que a denúncia pode ser anônima. O que mudou? A
crueldade dos crimes. Por exemplo, os estupros coletivos foram explicitados.
Esse com a menina de 16 anos...
Nina Fideles – Se deve a quê este aumento?
O aumento da crueldade é a história da relação de posse, da
propriedade, não basta matar, não basta estuprar. Estuprar, matar, decapitar...
O patriarcado afirma “ela é minha”.
Nina Fideles – Não havia isso antes já?
Havia, mas não era explicitada, divulgada essa crueldade. Por
exemplo, o que o goleiro Bruno fez com a Elisa Samúdio é de uma crueldade!
Matar, decapitar, botar no cimento ou dar pros cachorros, isso é de uma
crueldade. Agora, isso coletivamente você imagina. A de Castelos, no Piauí,
três meninas, quatro, saíram da escola e duas foram jogadas no despenhadeiro.
Que é isso? Isso não é patológico. Isso é patologia social. É o machismo e é a
sensação de impunidade. Nina Fideles – Mas a senhora acredita que a partir
dessas políticas públicas implementadas no enfrentamento à violência, se
colocou em pauta o conceito de gênero e isso incorpora a sociedade na questão
da mulher? Já. A Câmara aprovou uma mudança na Lei Maria da Penha, nós éramos
contra, e essas mudanças estão no Senado, é o PLC 7, que o relator é o Aloísio
Nunes. Eles estão aproveitando agora, com esse golpe, para fazer todas as
maldades nas perdas dos direitos. O que eles querem? Em parceria com algumas
delegadas e delegados, eles querem aumentar a atribuição das delegacias, porque
cada ente tem uma atribuição. Atribuição de expedir as medidas protetivas em
caráter de urgência para o juizado especializado. Com essa rede de
enfrentamento, com as casas, as medidas estão sendo expedidas em menos de cinco
horas. Eles querem que as delegacias passem a expedir as medidas de urgência
protetivas, até que o juiz autorize. Isso é um horror, por que as delegacias
não têm efetivo, não funcionam 24 horas por dia, não funcionam final de semana,
vide aqui em São Paulo, e nós só temos 585 delegacias no Brasil.
Então, vai aumentar mais uma tarefa, mais uma atribuição para
uma delegacia que não está dando conta, e o risco disso é transformar a
delegacia num super poder policial. E a violência contra a mulher ficar apenas
como caso de polícia, como o ministro Alexandre de Moraes quer fazer. Cria um
departamento de mulher na Polícia Federal. Quer dizer, desidratou a Secretaria
de Políticas para Mulheres totalmente, virou um puxadinho do Ministério da
Justiça, sem recursos, sem nada. Então, isso é no âmbito do enfrentamento à
violência. Nós avançamos também muito na área de autonomia econômica.
Conseguimos regulamentar a PEC das trabalhadoras domésticas, ampliar o direito
para todas as trabalhadoras; conseguimos com o Programa Pró-Equidade de Gênero
e Raça que mais de cem grandes empresas como Wal-Mart, Avon, Latam, recebessem
um selo de boas práticas de gênero, e do combate ao racismo no interior das
empresas. O que é isso? Facilitar com que as mulheres ascendam na carreira. A
formação e a capacitação de trabalhadoras e das mulheres para o mundo do
trabalho, e para romper com o ciclo da violência. Na área das políticas intersetoriais
nós conseguimos fazer uma transversalidade enorme com todas as políticas do
governo, Luz para Todos, Minha Casa Minha Vida, Pronatec, Bolsa Família,
incluímos a perspectiva de gênero em todas as políticas. Na área rural, a
questão da titulação de terras para a mulher, inclusive quilombolas. E documentação
também. Nós demos um milhão duzentos e cinquenta RGs... Porque veja bem, o que
é uma pessoa sem um RG, sem o documento de identidade? Não é nada! Não é
cidadã, não é cidadão, não é nada. Eu entreguei o milionésimo em Salvador, com
a presidenta. Eu chorava.
O Minha Casa Minha Vida, quando eu entregava no interior do
Brasil inteiro, 98% são mulheres chefes de família, gente. E mulheres que
sofreram violência doméstica. E mulheres negras. E mulheres que tem quatro
filhos, cinco filhos, três filhos. E que saíram de áreas de risco. Então, são
direitos inomináveis e incontáveis.
Lilian Primi – E com muito pouco dinheiro. Quanto se gastou para
fazer 1 milhão de documentos?
Nada, nada, nada, porque foi em parceria com a Previdência, com
a Polícia Federal, com o Ministério da Justiça.
Lilian Primi – Que é o que o Estado deve fazer de qualquer
jeito.
Sim! Eu quero entrar na questão dos direitos de gênero. Nós
avançamos muito nessa transversalidade no âmbito interministerial. Nós
ocupávamos, eu ocupava um lugar nobre entre os ministros e ministras, e a Dilma
exigia e exige que todas as políticas sejam pautadas pela perspectiva de gênero
e raça. Não só na documentação, mas, por exemplo, na educação. Eu e o
Mercadante estávamos inserindo agora nas bases do currículo nacional a questão
de gêneros, tanto que no Enem a maior questão foi a questão da violência contra
as mulheres. Oito milhões de famílias discutindo aquilo, porque se eram 8
milhões de estudantes, eram 8 milhões de famílias discutindo violência contra a
mulher. E foi maravilhoso, porque depois nós fizemos a leitura das redações e
demos apoio a algumas mulheres que escreveram que estavam em situação de risco.
Olha só, gente. O embate que nós enfrentamos com o Senado, com o Congresso, e
com as Câmaras e com as Assembleias Legislativas, foi porque nunca se teve
nesse País congressos, câmaras tão fundamentalistas, tão atrasadas, tão
retrógradas, feito essa legislatura. Não passava nada. Retirar a perspectiva de
gênero do Plano Nacional de Educação é Idade Média, é Idade das Trevas.
Nina Fideles – E a senhora acredita que há muito desse caráter
no golpe?
Acho que há totalmente. Eu comecei a minha fala dizendo da
história do patriarcado. Então, existe uma máquina do patriarcado que determina
não só a elaboração, a execução das leis, mas faz a cultura machista, a cultura
impregnada nas pessoas. As pessoas não imaginam que aquilo é discriminação, que
aquilo é preconceito. Desde pequeno, azul na porta de nascimento do menino e
cor de rosa, isso é patriarcado. Se eu rompo com isso... É uma máquina o
patriarcado. É inaceitável para o patriarcado ter sido eleita uma mulher
sozinha, sem um homem, e no dia da primeira posse ela vai com a filha no carro
aberto – olha o simbólico – e a primeira coisa que ela fez, a primeira medida
dela, foi mudar presidente para presidenta. Vocês não querem imaginar o modo
como isso era visto em termo de chacota pelo mundo masculino. Eles têm todo
direito, o golpista Temer tem todo direito de tirar presidenta da placa e por
presidente, ele é homem, é uma questão de gênero. A Dilma fez uma portaria da
flexão de gênero em todos os diplomas, e ninguém cumpre. Nós reunidas colocamos
@, mas não, é engenheiros/engenheira. Então, começou com isso. A eleição, a
presidenta, os ataques misóginos. Eu impetrava recursos no Ministério Público
toda semana a favor da Dilma e contra essa misoginia absurda inaceitável. E
ela, como mulher, determinou uma forma de ser, certo? Colocou ministras, e
tinha um lado da política que ela não fazia igual todos os outros políticos
anteriores. Eu duvido que fizessem o que estão fazendo com ela com o Fernando
Henrique e com o Lula. É isso a misoginia.
Lu Sudré – Qual o peso dessa misoginia?
Eu acho que 70% desse golpe está no fato da inaceitabilidade. Se
nós não entendermos o patriarcado, nós não entendemos esse golpe. Porque para
eles é bela, recatada e dor lar (risos). O modelo é a primeira-dama interina.
Nós somos belas, da luta e da rua.
Nina Fideles – A senhora consegue mensurar o quanto a gente vai
retroceder em todas essas políticas?
Consigo! Eu acredito que se nós não entendermos que nós estamos
num novo patamar do neoliberalismo, por que isso não acontece só no Brasil,
aconteceu em Honduras, aconteceu no Paraguai, e outros lugares... Eu era
ministra e frequentava as reuniões de ministras e altas autoridades de mulheres
do Mercosul, antes e depois do Lugo sair, uma diferença abissal as diferenças
das propostas. Aconteceu com a Bachelet, aconteceu com Cristina – não que ela
foi retirada. É como se: “chega dessa esquerda, centro-esquerda. Vocês já
brincaram demais, agora acabou”. Então, esse neoliberalismo não vem só na parte
econômica. O que eles têm de ódio da presidenta Dilma, é que a presidenta Dilma
via na queda de juros uma possibilidade de uma distribuição maior da riqueza, e
olhava para o lucro dos rentistas. Não dos que tem conta, dos contistas,
mas dos rentistas do mercado financeiro. E hoje a modalidade do neoliberalismo
é essa, é a política cíclica, é aumentar os rendimentos e não mexer na taxa de
juros. Agora, não é só econômico, veja bem, esse neoliberalismo é cultural
também. E Foucault explica muito bem, eu estou até lendo um livro A
Nova razão mundial, que é de dois franceses, Dardot e Laval, em que
eles mostram isso. Ele é econômico, mas ele não é só econômico, ele é
político-econômico, porque ele mexe na biopolítica da sociedade. O que é mexer
na biopolítica da sociedade? É na cultura. Então torna o anormal, normal. Torna
aquilo que é uma anomalia, que nem é esse golpe, numa normalidade. Então isso o
que o Alexandre Frota fez comigo, ou está fazendo, (se referindo ao processo
movido contra ela pelo ator Alexandre Frota por danos morais em R$ 35 mil) é
uma expressão do fascismo, em que ele pode estuprar e eu não posso dizer que
ele é estuprador. Igualar a aposentadoria de mulheres e homens, o massacre
contra as ocupações no Minc... Volta o ministério, mas desidrata o Minc no seu
interior. Demissão, opressão, tiraram todo mundo. Acabar com o Pronatec, deixar
o Bolsa Família apenas para aqueles que ganham até 5%. E aí entra uma das
coisas que eu acho mais cruéis, que é a articulação total da grande mídia. É
massificadora. Vai configurando um conformismo violento. Essas violências que
acontecem na rua, eu mesma aqui em São Paulo, em dois restaurantes quase que
fui mandada embora. Tem raiva, vão pra brigar, mas eu brigo...
Lu Sudré – É justamente o que eles não querem.
Eles querem que a gente fique calada. Calada. É isso que é
política vil, querem que fiquemos caladas. Por exemplo, a escola sem partido, o
que é isso gente? É uma escola acrítica, é uma escola sem ideologia, sem
conhecimento, sem raciocínio, sem pensamento, sem nada. Como você vai dar
história do Brasil sem pontuar? Com esse ministro interino, o SUS (Sistema
Único de Saúde) vai, em vez de melhorar, vai fazer um plano de saúde pros
pobres. O que eles querem nessas eleições municipais? Que a gente não fale do
golpe, que desvie a atenção como se estivesse uma coisa normal. O que o
município tem a ver com o golpe? O que o golpe impacta na vida das pessoas? Eu acho
que a cada dia nós estamos perdendo um direito. O que ele fez com a Secretaria
de Mulheres, com a Seppir (Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade
Racial) e com a de Direitos Humanos de tirar R$ 13 milhões de programas
fundamentais que eram: demarcação de quilombos, da violência e de direitos
humanos, sobretudo voltados para a questão da política de proteção especial.
Tirou o dinheiro.
Nina Fideles – A Dilma, em entrevista para A Pública, afirmou:
“Eu fui feminista. Hoje eu sou presidenta”, ao ser questionada sobre o aborto.
A senhora concorda com essa posição?
A gente tem que entender essa coisa. Entender que o Executivo
não manda projeto, quem manda é o Legislativo. Mas o projeto para avançar na
permissividade do aborto, da interrupção da gravidez, tem que partir da
sociedade civil. Antes dessa legislatura, quando nós tínhamos um Congresso
muito avançado, o (José) Genoíno, a própria Marta (Suplicy), mas nós hoje temos
um Congresso dos mais fundamentalistas, mais atrasados, que quer
tirar palavra gênero da Lei Maria da Penha, tirou do PNE, porque gênero
diz mais do que mulher. Gênero diz homossexual. Então eu concordo com a
presidenta Dilma, sim. Ela é a presidenta e ela governou com um Congresso dos
mais conservadores e a sociedade civil também estava desarmada para apresentar
projetos de avanços. Nós temos mais de 32 projetos para retirar os direitos.
Então, o que nós fizemos, e eu peguei a gestão de três ministros da saúde, o
Padilha, o Chioro e o Marcelo Castro, mas com o Padilha e o Chioro nós
avançamos demais nos hospitais, na qualificação dos profissionais, dos 584
hospitais no Brasil que fazem a interrupção da gravidez nos casos previstos em
lei: casos de estupro, risco de vida à mãe e fetos anencéfalos. Nós
qualificamos, melhoramos, só ir aqui ao Hospital de Vila Nova Cachoeirinha.
Então o seguinte, tem uma coisa na lei que se chama objeção de consciência – se
o profissional se nega a fazer, e ele tem direito de se negar, o hospital não
tem direito de negar o atendimento.
Lilian Primi – Tem que pegar outro profissional.
Tem que pegar outro profissional e isso tem que ficar muito
claro. O profissional ou a profissional pode negar, é objeção de consciência,
mas a instituição hospitalar não pode. Eu fui coordenadora na Unifesp da Casa
de Saúde da Mulher Domingos Delascio, e a gente implementou todo o atendimento.
No Hospital São Paulo há a interrupção da gravidez, mas é um atendimento
integrado, psicológico, atendimento gineco-obstetra, atendimento social e tudo.
E ele é sustentado enquanto a lei existir. Uma dificuldade que eu enfrentei
muito foi na lei que determina atendimento universal a mulheres que são vítimas
de estupro, com a contracepção de emergência, da pílula do dia seguinte, e
tinham vários hospitais religiosos que não davam. Mas é lei, tem que oferecer.
Nina Fideles – E a sua posição de ministra com relação ao
aborto?
Quando eu assumi eu não deixei de ser um segundo favorável ao
aborto. Não sei se vocês lembram, eu fiquei seis meses na mídia, todo mundo
falando que eu era aborteira, que eu era a favor do casamento de pessoas do
mesmo sexo, enfim, e sou mesmo, e nunca na questão do aborto disse que tinha
mudado de opinião. Mas eu fui lutar em outra esfera, em outra frente. O
governo tinha uma diretriz, eu segui a diretriz na medida que eu aceitei, que
era batalhar para consolidar a qualidade no serviço de atendimento aos casos de
aborto previstos em lei.
Nina Fideles – E houve uma crítica muito grande dos movimentos
feministas de não avançar na pauta?
Há, e elas tem razão. Por isso que eu digo
que eu preciso do movimento, eu preciso da sociedade civil para me pautar, para
me pressionar, e me mostrar. Então, até onde eu vou e até onde elas vão. Pra
elas o céu é o limite. Eu quando estava na sociedade civil, meu limite era o
planeta. Agora, como ministra, tem um limite, por onde eu vou avançar mais e
por onde menos. A questão da descriminalização do aborto para mim nunca houve
dúvida. Eu sempre disse, até como ministra, que é uma questão de saúde pública.
É inadmissível que uma mulher morra por falta de atendimento nos hospitais
brasileiros por interrupção da gravidez. É inadmissível!
Lilian Primi – E decisão de foro íntimo.
E nessa decisão de foro íntimo, o Estado não pode intervir. O
Estado tem que pontuar, chegar num avanço de propor a melhor política. Por
exemplo, casamento de pessoas que tenham o mesmo sexo. O Congresso não
avançaria nunca, o STF pautou e venceu, e depois mandou todos os cartórios
aceitarem. Quem quer vai, quem não quer não vai. Os gays e lésbicas que querem
se casar vão, aqueles que não querem não vão. Mas precisa ter uma garantia para
o exercício da escolha. A escolha não é só teórica, entendeu? Então, tem gays e
lésbicas que não querem casar, embora a lei permita.
Lu Sudré – Eu acho que as pessoas confundem muito ser favorável
ao aborto, à prática, e à questão da legalização.
Eu não sou favorável ao aborto porque eu acho que é uma situação
muito sofrida e muito doída para a mulher. É a mulher que decide, o homem não
participa, a decisão é dela. Então, você tem que respeitar aquela decisão, mas
tem que ter uma política que acolha aquela mulher em qualquer das decisões.
Hoje nós não temos um cenário no Brasil que permita avançar.
Lu Sudré – Eu queria que a senhora falasse sobre a questão das
mulheres negras dentro deste contexto de violência contra a mulher.
Entre as 52% de mulheres no Brasil, 48% são mulheres negras, e
essas mulheres são as mais atingidas tanto na violência doméstica, quanto no
atendimento à saúde, quanto na mortalidade materna, como na mortalidade
neonatal, mortalidade infantil, salários mais baixos, ocupar lugares... Nós
temos três negras só no Congresso Nacional, Benedita, Tia Eron e a Rosângela.
Veja, do ponto de vista da cultura, o racismo ainda existe violentamente
presente. Para mim são três elementos estruturantes da sociedade brasileira:
divisão de classe, divisão de gênero e desigualdade racial. Gênero, classe,
raça. Depois homofobia, transfobia, tudo vem daí, vem desse caldo de exploração
e de opressão. O que nós fizemos? Nós avançamos em cotas, a Luiza Helena
Bairros, que morreu agora pouco, foi responsável pelas cotas, pelo programa de
acabar com o extermínio da população jovem negra... Fizemos o Programa
Juventude Viva, a Seppir e nós, o Ministério da Justiça e o Ministério da Saúde
e Direitos Humanos. Fizemos cotas no serviço público, aumentamos a demarcação
dos quilombolas, incluímos as mulheres de matrizes religiosas africanas nos
processos. Todas foram delegadas, tive delegadas de todas elas na IV
Conferência de Mulheres, foi impressionante. Mas elas são sim as maiores
atingidas, não há dúvida. Mesmo o nosso governo, que tinha ministra negra,
poderia ter tido mais ministros negros. Mas avançamos muito na questão
cultural. Incluímos o racismo na base de currículo nacional.
Lilian Primi – Todas essas mudanças que foram feitas em direitos
humanos, são legados sustentáveis?
São, mas, veja, são sustentáveis desde que você tenha no
nacional uma gestora ou um gestor forte nessa área – que briga por recursos.
Que você tenha no estadual, e no municipal que é aonde acontece, idem.
Lu Sudré – Se a instituição tem essas limitações, de poderes
locais e do Executivo, como a gente avança na pauta de gênero nesse diálogo
entre os poderes e a sociedade?
Sociedade civil. Enquanto não houver uma sociedade civil forte,
que pressione... Se a sociedade civil não for pra rua gritar pela manutenção
dos direitos – e eles estão todos indo por água abaixo –, não tem como. E as
mulheres são protagonistas na resistência ao golpe porque se veem na Dilma.
Mexeu com ela, mexeu comigo. E quando ela se elegeu e reelegeu, todas as mulheres
se viram com potencialidade de serem presidentes da república.
Lu Sudré – Identidade... Identidade! Identifica inclusive mulheres
que não são a favor do governo da Dilma.
Nina Fideles – A Kátia Abreu, por exemplo, tem uma trajetória
muito distante de luta, principalmente na área rural. O que faz ela defender
tanto a Dilma? Nos surpreende...
Veja, eu inclusive descobri uma outra Kátia Abreu. Uma mulher
generosa, uma mulher solidária, e uma mulher que tem gana de aprender, de ler,
de se informar e de se transformar. E ela viu de perto a honestidade, a
dignidade e a ética da presidenta Dilma. Ninguém contou pra ela, ela viu.
Lu Sudré – E tem uma questão da sororidade?
Tem, absoluta. Porque ela viu, é a “mulher mais honesta que eu
conheço”, ela fala isso. E não é gratuito, veja, para ela é muito difícil ter
assumido isso publicamente porque praticamente ela está sem partido.
Lu Sudré – Pessoalmente você acha que os movimentos de rua deram
uma caída?
Eu acho que deram, não uma caída, refluíram um pouco, porque primeiro
é muito tempo, nós vamos para três meses de resistência. Não acho que perderam
a força. E acho que a Dilma cresceu cem por cento nesse processo, vem mostrando
a resistência que ela tem, a força que ela tem. Eu a tenho acompanhado em
vários atos, várias viagens e é impressionante a força dela. Não existe na vida
da Dilma a palavra renúncia. Era o que eles mais queriam, que ela renunciasse,
porque ela é um incômodo.
Nina Fideles – Mas a gente pode afirmar, grande parte da
esquerda diz, que a política de alianças também nos levou a esse caminho?
Eu acho que o que levou a esse – eu não vou nem dizer o que a
política de esquerda fala, nem muita gente de esquerda –, mas, eu acho que é
inviável ser no presidencialismo outro tipo de governo que não o governo de
coalizão. Mas eu acho que foi uma coalizão ampla demais. Não precisa eu achar.
Foi coalizão ampla demais porque olha no que deu.
Nina Fideles – Então há uma autocrítica com relação a isso?
Sim, claro, claro. Dormir com o inimigo, chega!
Lilian Primi – E ainda tem esse Congresso...
Quem vota? A população. Quem vota no Marcos Feliciano aqui em
São Paulo? Quem vota no Bolsonaro? Quem vota em todos esses caras? É a
população, é ali que eu vou, na cultura. Se nós não desconstruirmos isso, não abrirmos
os corações contra o inimigo, não avança. Eu sou a favor do voto distrital. E
se não fizer uma reforma política no nosso País, não vai.
Nina Fideles – A senhora presenciou dois golpes, não é, com
características bem diferentes.
Esse é o terceiro na verdade. Eu estava entrando na
adolescência, eu era menina, tinha 9 anos quando o Getúlio morreu, eu lembro
perfeitamente. Estava no quarto ano primário, eu fui tirada da escola. Eu
morava numa cidade do interior de Minas, chamada Passos, “morreu Getúlio,
morreu Getúlio”. Vi, vivi intensamente a história do João Goulart, do golpe de
64. Eu já era militante do Partido Comunista Brasileiro, eu lutei contra a
ditadura, fui presa, resisti, saí, construímos uma geração toda, construímos
essa democracia e agora ver essa democracia ser apunhalada, a Constituição
brasileira apunhalada, é triste. Quem está sendo apunhalado é a minha geração.
Nina Fideles – Mas a senhora acha que a gente pode vir a viver
um tempo tão sombrio quanto 1964?
Eu acho, pode ser, pode ser. Eu acho muito sombrio, gente,
porque, me desculpe lembram da República de Weimar, na Alemanha? Ela foi o
prenúncio.
Lilian Primi – E começou com essa manipulação midiática.
Midiática toda. Lá foi isso, midiática no Congresso, na Câmara,
nos poderes.
Lilian Primi – Eles trocaram o significado das palavras. E aqui também
tem sido feito isso. E é o que tem sido feito, tem sido isso, porque o fascismo
está no dia a dia. É o discurso de ódio. E muda o sentido das palavras. Isso é
fascismo. Tem que entender isso.
Lu Sudré – Você acha que vai vir uma reação?
Então, a reação do Getúlio foi uma, foi muito maior, porque eles
não esperavam que ele se suicidasse. Aí é que ele se transforma de pai dos
pobres. No caso do Jango – não tivemos reação. Fomos presos, torturados... O
movimento estudantil tentou, mas não foi possível, fomos massacrados.
Lilian Primi – E você foi pra luta armada?
Sim. Eu quando fui presa era do POC – Partido Operário
Comunista. E nós fomos presos, torturados, arrebentados. Toda reação era arrebentada,
com armas, com fogo, com tudo isso. E esse agora, eu tenho pra mim, que é um
golpe diferente porque ele está nas entranhas.
Nina Fideles – No golpe atual o que surpreende um pouco é a
participação do Judiciário?
Sim! Mas lá em 64 também. E agora teve essa reação boa, teve
essa mobilização, está boa, tem o refluxo próprio de movimento de massa.
Lu Sudré – Qual é o perigo de a gente viver numa democracia em
que as pessoas odeiam a política?
Volto a dizer que a cultura fascista vai trazer isso. Vai surgir
um Berlusconi, eu estava na Itália fazendo pós-doutorado, eu vi. Lembro-me
perfeitamente quando o Brasil ganhou a Copa, a gente saiu de madrugada pra ver,
e os italianos comemorando a Copa do Brasil. Algum simbolismo tinha. Como nós
aqui na ditadura que não queríamos que o Brasil ganhasse a Copa de 70. E o que
foi aquilo do Temer de chamar a imprensa para aquela ação midiática de ir
buscar o filho dele na escola? Pelo amor de Deus, está construindo a figura. E
esse pseudo aspecto de legalidade institucional que o Brasil segura, basta ser
uma boa leitora, um bom leitor, que você entende isso perfeitamente.
Lilian Primi – Até os institutos de pesquisa que são favoráveis
ao golpe, mostram que ele é odiado. Isso não muda em nada a força política
dele? O que acontece?
Se o Congresso ouvir, muda. A grande questão hoje é que nós
podemos ter um movimento social muito importante, mas que o som dele não
ultrapassa as barreiras do Congresso Nacional. É um golpe absolutamente
articulado por essas forças todas que eu disse pra vocês. Midiático,
fundamentalista, misógino, patriarcal, e capitalista; e o pato da Fiesp, quem
pagou? Não fomos nós. Acabar com a partilha do pré-sal que o Serra quer, está
entregando de mão beijada para os Estados Unidos, não tenho a menor dúvida.
Então, tem uma articulação, para mim, internacional do capital, juros e renda,
os rentistas administrando os juros.
Lilian Primi – E também a exploração de riquezas.
Claro, exatamente! E demarcar cada vez mais a desigualdade
social; e acabar com essa história de inclusão social. E, é uma articulação
muito forte. Tem as fitas gravadas do sr. Sergio Machado, que vieram à tona e
que disseram “vamos derrubar a presidenta Dilma”, disse o Jucá, “porque ela não
vai estancar essa sangria da Lava Jato”. Então, a única presidenta, que não
resvala sobre ela nenhuma denúncia, é incorruptível, foi deposta pelos
corrompidos. E, convenhamos, chega de selecionar as delações, é só em cima do
PT.
https://www.carosamigos.com.br/index.php/grandes-entrevistas/9515-eleonora-menicucci-feminismo-de-classe,
21/10/2017, 20:55
Nenhum comentário:
Postar um comentário